Pela natureza desgastante do serviço bancário, a CLT estabelece uma jornada especial para a categoria, de seis horas diárias (artigo 224).
Acontece que os bancos, aproveitando-se de uma exceção prevista no parágrafo 2º do artigo, acabam atribuindo funções de nomes pomposos a bancários que exercem tarefas meramente técnicas, dando a impressão de que eles exercem “funções de direção, gerência, fiscalização, chefia e equivalentes ou que desempenhem outros cargos de confiança”, inserindo a rubrica “gratificação de função” como composição salarial no valor de 55% do salario base.
Conforme a redação da Cláusula 11 vigente desde 09/2018, mesmo que o bancário ganhe judicialmente o direito das 7ª e 8ª horas como horas extras, obrigatoriamente terá de ser descontado do valor total da ação o valor já recebido pelo bancário a título de “gratificação de função” em holerite, reduzindo para maioria dos trabalhadores em zero o valor a receber de 7º e 8ª hora.
A aplicabilidade da cláusula, ainda que prejudicial aos trabalhadores, foi discutida em sede de repercussão geral reconhecida (Tema 1.046) – decidindo que, acordos ou convenções coletivas de trabalho que limitam ou suprimem direitos trabalhistas são válidos, desde que seja assegurado um patamar civilizatório mínimo ao trabalhador.
Assim, analisando friamente os termos da cláusula 11 da CCT dos bancários, os trabalhadores teriam deferido valores referente à 7º e 8º hora, mas não receberiam absolutamente nada, verdadeiro “ganhou, mas não levou”, evidenciando explícita má-fé dos Bancos, no acometimento de fraude à legislação trabalhista.
Neste sentido, tivemos recentes decisões favoráveis aos trabalhadores, cujas decisões salientaram sobre a fraude perpetrada pelos Bancos, quanto ao específico tema, envolvendo a correlata cláusula 11 da norma coletiva:
“Todavia, uma norma coletiva elaborada pelos entes sindicais da categoria não pode determinar como o Poder Judiciário procederá em caso de reconhecimento de fraude à legislação trabalhista.
Quando se afasta a aplicação do art. 224, §2º, da CLT e se determina a aplicação da jornada prevista no caput, a Justiça do Trabalho reconhece que o banco praticou fraude à legislação trabalhista. Cabe, assim, ao Poder Judiciário definir as consequências da fraude.
Nada impede que seja editada norma estatal determinando a forma como o Poder Judiciário deve agir (o que efetivamente ocorreu com a MP 905/2019, que inseriu o §4º ao art. 224 da CLT durante a sua vigência). O que não se pode admitir é que os sindicatos determinem como o juiz deve julgar o processo.
De qualquer forma, a compensação requerida pelo banco não é possível, uma vez que o bancário não enquadrado no § 2º do art. 224 da CLT, que receba gratificação de função, não pode ter o salário relativo a horas extraordinárias compensado com o valor daquela vantagem (Súmula 109 do TST). Com efeito, a gratificação tem por objetivo remunerar o trabalho exercido, e não as horas extraordinariamente trabalhadas.”
(Processo nº 1001550-10.2021.5.02.0062 – Sentença publicada aos 29/11/2022)
“Observe-se, entretanto, que uma norma coletiva elaborada pelos entes sindicais da categoria não pode determinar como o Poder Judiciário procederá em caso de reconhecimento de fraude à legislação trabalhista.
Neste sentido, ao afastar a aplicação do art. 224, §2º, da CLT e reconhecer a jornada prevista no art. 224 “caput”, tem-se o reconhecimento da fraude à legislação trabalhista, motivo pelo qual cabe ao Poder Judiciário definir as consequências jurídicas.
Veja-se, portanto, que os efeitos decorrentes da fraude declarada pelo Poder Judiciário não podem ser determinados pelos entes sindicais, mas apenas pelo magistrado em sua decisão judicial.
Ademais, observe-se que também não cabe à cláusula coletiva alterar a natureza jurídica de uma parcela (cláusula 11 § 4º). Desta forma, tem-se que a
gratificação de função remunera apenas a função exercida pelo trabalhador, e não as horas extras laboradas, de modo que a compensação requerida pelo banco não é possível, uma vez que não é possível a compensação de parcelas que não possuem a mesma natureza jurídica (Súmula 109 do TST).”
(Processo nº 1000659-31.2022.5.02.0069 – Sentença publicada em 01/12/2022)
De tudo que tem sido discutido no Judiciário, chegamos à ilação que o pedido de pagamento da 7º e 8ª hora ainda é pertinente, e que o tema/direito deve ser levado à discussão do Judiciário para que possamos construir uma corrente sobre a inaplicabilidade da cláusula.
Outro ponto, é que os Bancos temem ainda pela segurança jurídica da cláusula, e não se eximem em realizar acordo nas ações recentemente distribuídas, demonstrando assim a viabilidade da manutenção do pedido de 7º e 8ª hora.